Ana Luisa Amaral
UNIFICAÇÕES
Uma pomba passeia em Friedrichstrasse,
numa Alemanha tocada
em unificação
– e o que desejo unidos são retratos
de coisas passageiras:
um muro mal timbrado ao longo da cidade,
um segredo de sol
Têm maçãs, as árvores
que agora desenhei?
Talvez tenham maçãs, se as quiser por ali,
em desenho, em poema.
Talvez tenham um canto de sereia,
talvez um estilo próprio
Como se fossem coisas
verdadeiras
Um olhar,
uma árvore, uma coisa
qualquer, e a partir daqui,
voar
para sítio tão longe
e que te fosse tão enfurecido
que ver-te novamente por dentro não consigo
(e odeio estes retratos a
duas dimensões)
Odeio estes retratos.
E coisas tão solenes a repetir-me
em vento o que não sei,
o que queria que fosse
mais azul
São maçãs o que vejo?
Poderão ter maçãs as árvores
que há pouco desenhei?
Ou tudo o que lhes resta: só retratos
devagarmente feitos
– devagar?
Uma pomba passeia em Friedrichstrasse,
numa Alemanha tocada
em unificação.
E o que desejo unido é o retrato das coisas
que não sei
Em vez, dentro:
uma lágrima a pintar o mais disperso,
o frágil como asa,
uma bênção que sei não encontrada
Como essa pomba que voou
agora —